toujours sur la mort

dando continuidade a um certo estado de espírito mórbido (depois do gunther von hagens), menos por fase que por afinidade, ainda e essencialmente ligado à arte, vou tanger o tema da escultura do kris kuksi, a saber, religiosidade, morte, guerra; tudo permeado de uma pegada muito bem humorada, uma comicidade nos detalhes, na mistura de materiais, na interpenetração de temas

nossa, me senti “o” crítico de arte agora… cada palavra bunita…

melhor que falar, analisar e fingir entender, mostrar. treine sua própria percepção. no site dele (clique no nome dele acima), é possível dar zoom e ver muitos, muitos detalhes interessantes (clique nas imagens abaixo para aumentar o tamanho):

kris kuksi _the palace of hedonism

kris kuksi _the palace of hedonism detail

kris kuksi _the palace of hedonism detail

no site dele tem muita coisa bacana pra ver. coisa de quem tem tempo pra matar, claro… não é à toa que eu escolhi justamente essa escultura pra por no blog. repare no nome dela…

ainda no ambiente da arte, só que além do tema da morte, gosto bastante da pintura realista cotidiana americana, especificamente a do edward hopper. não deixa de ter uma certa similaridade com a morte, já que o tema dele é a solidão, o vazio, o silêncio

dentre todos os quadros dele, um dos meus preferidos é esse aqui:

edward hopper _sun in an empty room (1963)

gosto especialmente por causa do sol, apesar do vazio, do silêncio, da solidão…

que contraste gostoso com o kris kuksi ou com o gunther von hagens, né?

do hopper, também adoro a luminosidade e as cores vivas nessa rua aqui:

edward hopper _early sunday morning (1930)

que mais orbita minha cabeça ultimamente? édipo rei, de sófocles (oedipo tirano, no título original em grego – OΙΔΙΠΟΥΣ ΤΥΡΑΝΝΟΣ), mito e tragédia na grécia antiga, um livro do jean-pierre vernant & pierre vidal-naquet, pra entender melhor o édipo tirano, além de continuar lendo o mundo, do schopenhauer

tudo muito agradável

como eu sempre digo: aprender é mais gostoso do que saber…

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ταυρομαχία

tauromaquia. corrida de toros. espetáculo em que habilidoso el matador leva lenta e dolorosamente à morte um animal que devia estar pastando e fazendo, sei lá, as coisas que os touros normalmente fazem

esse espetáculo remonta ao culto pré-histórico do boi como entidade divina sacrificada, e aos gladiadores de roma que se divertiam matando não só touros e outros bichos, mas também uns aos outros

estado de natureza em estado bruto. nada mais natural que o estado das coisas chegue a isso:

bem feito

acho ótimo. repare que o animal sangra em profusão por causa das banderillas cravadas em seu corpo (6 normalmente). o outro animal deve ter sangrado bastante também. olha que legal a descrição do que aconteceu: “[o chifre entrou] na região submandibular com uma trajetória ascendente que penetra até a cavidade bucal, atravessa a língua, sobe ao céu da boca, com fratura do maxilar superior.” (folhaonline)

tenho desenvolvido um gosto mórbido (vingança?) por descrições técnicas minuciosas desse tipo. gosto tanto quanto o prelúdio ao livro do françois forestier, “marilyn & jfk”. leia um trecho no site da veja: leia mesmo!

e pra quê tourada? tudo muito cretino. ser humano estupidamente absurdo. o objetivo final é esse:

rigor mortis

no brasil tinha também. getúlio proibiu em 34, junto com rinha de galo, outra estupidez. a única instância da tourada que eu aprecio é no poema do joão cabral de melo neto, “alguns toureiros”, por causa das peculiaridades próprias à poesia

(…)

Mas eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete, o mais deserto,
o toureiro mais agudo,
mais mineral e desperto,

o de nervos de madeira,
de punhos secos de fibra
o da figura de lenha
lenha seca de caatinga,

o que melhor calculava
o fluido aceiro da vida,
o que com mais precisão
roçava a morte em sua fímbria,

o que à tragédia deu número,
à vertigem, geometria
decimais à emoção
e ao susto, peso e medida
,

(…)

muitos pintores retrataram a tourada; eu gosto desse quadro do manet:

toter torero

assim é melhor (pela arte ou pelo lado da morte…?)

.

rods & ancient world

seriam os rods, criaturas misteriosas em forma de serpente com asas, muito muito muito rápidas…

rods always appear in key locations

…o equivalente às descrições de povos antigos (maias, astecas, chineses, hindus) de deuses que vinham visitar o planeta terra?

Quetzalcoatl - a serpente alada

estarão eles voltando por algum motivo?

…adoro essas teorias…

Sors de l’enfance, ami, réveille-toi!

Adoro citações en français. Elas são muito chiques e parece que, porque em francês, são muito mais verdadeiras. Além do que, faz parecer a quem ler o que eu escrevo, que eu tenho aquela casquinha intelectual de que o Mário de Andrade falava.

A máxima-título deste post é do Jean-Jacques Rousseau e serviu de epígrafe aO Mundo, do Schopenhauer: “Sai de tua infância, amigo, acorda!” (uma pancada na cabeça) (Já tinha falado do Rousseau em outro post – saber viver como a natureza exige). Gosto do Schopenhauer porque ele fala sobre como viver aceitando todas as limitações da existência, com o respectivo impacto do desejo e suas frustrações no nosso bem-estar. Überracional. (Como eu sei que nem todo-mundo vai ter saco/tempo pra ler O Mundo, eu vou abordar alguns aspectos aqui – no blog, não no post -, eventual e paulatinamente.)

Freud foi largamente influenciado por Schopenhauer, por sua vez iluminado por Descartes, Kant e pela filosofia milenar do Hinduísmo e sua Lei Eterna (essa epifânia, dividida em Vedas = conhecimento, e Upanixade = meditação e filosofia, também fica pr’uma próxima). Freud apreendeu o conceito de vontade e representação e desenvolveu a teoria do desejo, da repressão, id, ego, super-ego. E claro que ele leu muita coisa en plus de Schopenhauer.

Outra citação en français que eu gosto bastante é “J’ai plus de souvenirs que si j’avais mille ans“, do Baudelaire (Spleen), que significa “Tenho mais lembranças do que se tivesse mil anos”. Demais, não? Gosto de acreditar que, se reencarnações houvesse, eu já teria vindo e ido muitas muitas muitas vezes. Talvez por isso goste tanto desse poema do Baudelaire. Perfeito para um pirata cansado.

Já deu pra perceber que eu gosto muito da literatura do século 19. Adoro esse pessoal que fundou ou veio depois do Iluminismo. Não vou nem chegar perto da questão Renaissance-Siècle des Lumières e suas subsequentes subdivisões porque isso vai longe e inclui muita muita gente (beaucoup de gens et d’artistes studieux). Mas é gostoso demais ler gente que despertou do obscurantismo da idade média e descobriu a racionalidade dos fenômenos, indo muito além da mera observação. Eles conseguiram pensar em presque tout.

Hoje acordo com uma porção de coisas pra fazer (não muitas, é verdade, ao contrário do que todo-mundo diz. Todo-mundo está sempre muito ocupado em mentir no currículo…). No meio de tudo isso, tenho as minhas expectativas para o dia e uma panóplia de quimeras. Quase todas se frustram e eu tenho que lidar com isso, material e emocionalmente. Nos dias de sorteio da megasena eu acordo e desejo: ai meu Deus, hoje vou poder ajudar minha família e meus amigos, vou comprar meu apartamento e um audi A3, e vou dar um giro pelo mundo… Quase todo dia seguinte eu tenho que lidar – de novo – com a frustração da pobreza, com o esforço inútil e vão de vender minha inteligência e meu trabalho para comprar migalhas de desejos. Sorry friends; better luck next time.

Lembrei de outra citação que eu gosto, dessa vez do Manuel Bandeira: “A vida é uma agitação feroz e sem finalidade (…)”.

Das relações entre elite (essa pouca gente que concentra quase toda a riqueza do mundo há séculos e chega até a casar incestuosamente para não ter que dividir), e mão-de-obra (essa toda outra gente que produz, sonha, e sofre com as limitações financeiras, e pode eventualmente incluir a bourgeoisie), e das relações entre arte/intelectualidade e trabalho, gosto dessa citação, en française, claro, “Je suis un homme spiritualiste etouffé par une société materialiste, où le calculateur avare exploite sans pitié l’intelligence et le travail” (sou um homem espiritualista cansado de uma sociedade materialista, onde o agiota avaro explora sem piedade a inteligência e o trabalho), Alfred de Vigny, da turma do Charles.

(Por que os banqueiros arrancam todo o nosso dinheiro das maneiras mais criativas e compulsórias e depois aparecem na mídia fazendo caridade?? É como a Shell ou a Petrobrax (lembra disso?) fazendo propagandas como se se preocupassem com o meio ambiente…)

Voltando: gosto dessa turma toda porque eles me ajudam a obter um certo equilíbrio psicológico para as minhas frustrações, equilíbrio que não chega a resolver meus problemas, minhas dúvidas, mas me dá um certo conforto, uma certa sabedoria que serve apenas para me consolar de forma racional nos momentos mais agudos de tristeza com o mundo pelo o que o mundo é, ponto. O Harold Bloom tem uma definição muito legal para a sabedoria: aquela vozinha que dialoga com você quando você está quietinho, sozinho, refletindo sobre o conhecimento que você adquiriu. Não pode ser compartilhada; a sabedoria é uma coisa só sua. Gosto disso. Faz muito sentido. O Harold Bloom é genial e esse livro deve ser lido por todo mundo interessado em aprender sobre a busca pela sabedoria de todos os povos através da História e em se sentir melhor consigo mesmo.

Harold Bloom, Vigny, Freud, Schopenhauer… Eles me ajudam diariamente a conviver com meus desejos, minhas vontades, o que eles representam individualmente para mim, e a aceitação das frustrações e das limitações da existência, que são muitas muitas (ils sont très nombreux). Além de apreciar profundamente, óbvio, toda a beleza artística da œuvre deles. Gostaria de compartilhar esse sossego espiritual, mas cada um tem que achar o seu. Muita gente tenta isso através das religiões, mas elas, para mim, só fazem piorar tudo. Contudo, se você está interessado no ramo das religiões e quer investir seu tempo e seu talento nisso, leia a Entrevista com o profissional. Pra mim, a mais perspicaz, verossímil e franca entrevista da história da humanidade!

A leitura do Schoppy tá só no começo. Provavelmente ainda vou voltar a esse assunto outras vezes. Conclusão: saiba que perceber de maneira realista os seus impulsos primordiais dos desejos profundos, o constante querer querer não vai cessar nunca. Uma condição triste dos seres capazes de abstrair. Antes que você pergunte, só o homem consegue fazer isso, dentre todos os bichos existentes (os ETs supostamente não têm esses conflitos…). A convivência com esse almejar incessante (seja lá o que você queira) dura a vida toda, não tem cura e paradoxalmente é parte inexorável do que você e eu queremos ser. Lide com isso (o mundo como representação). Pessimisticamente fato. Acorde da infância. Você vai sempre querer querer. Mas tem que saber disso.

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PS: este post inaugura o novo visual do meu blog e é o primeiro também com o título em francês (quem é espertinho já percebeu que os títulos são todos em inglês) (peraí que eu babei no teclado…). A imagem no header é uma concepção artística que eu achei no site da National Geographic sobre o fim do universo, quando ele voltar ao seu ponto inicial, pré Big Bang, antes da infância. Por mim, podia ser na semana que vem, cheio de som e de fúria…

…mesmo no vácuo… oommm…