chaos

olha o que o ser humano é capaz de fazer:

nada de especial aconteceu: só um semáforo sem funcionar...

dá pra ter esperança na humanidade assim? não, não dá: é foda. preste atenção: o semáforo queimou e os animais dentro de cápsulas de aço criaram um bonito padrão de tecitura sobre o asfalto. é preciso um certo treino nas belas artes para apreciar a intricada trama…

eu sinto cada vez mais repulsa em me locomover pelo trânsito da cidade porque as pessoas não tem a menor noção de cidadania, nem respeito um pelo outro. mais, o ser humano é um bicho tão burro, mas tão burro, que não é capaz de ceder um pouco, nem que seja em benefício próprio. sua visão estratégica estende-se por 3 milímetros à frente do nariz. burro, egoísta, animalesco. e nem teve ameaça de revolta contra a população burra por parte do pcc… lembra que comparam o comportamento das pessoas a galinhas em pânico? essa imagem é do Drummond. leia. preste atenção à parte em que ele fala dos homens voltando pra casa, menos livres, levando jornais…

Drummond

A flor e a náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cizenta.
Melancolias, mercadorias, espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?
.
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que triste são as coisas, consideradas em ênfase.
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Vomitar este tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam pra casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
.
Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.
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Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.
.
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
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Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.
.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens macias avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.
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